Ciberbullying: o que escolas e professores podem fazer

Numa altura de regresso às aulas, consideramos oportuno refletir sobre o ciberbullying e qual o papel das escolas e educadores perante situações de violência. Partilhamos, assim, uma série de considerações que podem ser úteis ao abordar esta realidade em sala de aula.

Hoje em dia, as redes sociais são parte integrante do dia a dia das pessoas, pelo que grande parte das agressões que começam no âmbito escolar terminam publicadas nas redes sociais. As escolas tendem a confundir o mundo digital com um mundo irreal ou virtual no qual as problemáticas vão para além do âmbito escolar ou não têm a devida importância. Contudo, ao contrário do bullying tradicional, o ciberbullying tem um impacto maior nas vítimas, que geralmente é ignorado até que muitas vezes é tarde demais.

Na Internet o bullying tem outro impacto

O primeiro passo passa por entender que na Internet tudo tem um impacto maior. Uma publicação chega milhares de pessoas numa questão de minutos e em pouco tempo todas essas pessoas falam e opinam sobre o assunto. O conteúdo agressivo magoa e faz muitos mais estragos. E conforme mais pessoas acedem à publicação, colocam ‘Gosto’, partilham e comentam, maior é o impacto. Muitas pessoas começam a opinar e falar sobre o conteúdo publicado, e isto pode causar sérios transtornos quando a publicação se refere a uma determinada pessoa. Por último, uma vez que o conteúdo se tenha tornado viral, é impossível detê-lo ou eliminá-lo por mais que quem publicou se arrependa.

Por outro lado, quando o que têm pela frente são ecrãs e redes sociais e não pessoas, muitas são as crianças que se atrevem a dizer e fazer coisas no mundo digital que não fariam no mundo físico.

Neste contexto e no sentido de fomentar ações proactivas para trabalhar temáticas como o ciberbullying e agressões on-line, propomos quatro pilares que todas as escolas e docentes podem implementar para tratar esta problemática.

1. Formar bons cidadãos digitais

Assim como o mundo digital é parte da vida real, as regras e maneiras que se aplicam aqui devem ser as mesmas que já conhecemos no mundo físico. Ensinar às crianças o respeito e normas de convivência deveria contemplar o âmbito da Internet.

A educação neste contexto deve considerar aspetos relacionados com o tratamento e comunicação através de meios digitais. Matérias como educação cívica ou cidadania devem transcender a fronteira física e passar a incluir também temas como a ética, moral e respeito no mundo digital. Por outro lado, os exercícios e atividades em equipa também são uma forma poderosa de fazer com que os grupos se comportem de forma coesa.

O objetivo destas atividades é fazer com que todos os alunos da turma trabalhem juntos com um objetivo comum, utilizando todas as suas fortalezas individuais e valorizando as capacidades de cada pessoa para completar uma tarefa. Atualmente, existem numerosas atividades que são possíveis de descarregar da Internet, e que podem mesmo realizar-se através do dispositivo móvel.

2. Consciencialização em vez de proibição

A consciência é uma arma poderosa e tem a capacidade de alterar as perceções sociais. Em vez de criar pânico sobre o uso da tecnologia ou difundir mal-entendidos, a consciência permite que surja uma atmosfera positiva.

Muitas escolas preferem proibir o uso da tecnologia, o que cria anticorpos entre os alunos, e faz com que a maioria opte por esconder os seus telemóveis e utilize sem que os professores percebam.

Os jovens identificam-se com a tecnologia e adaptam a mesma ao seu dia a dia. Assim, é importante mostrar aos alunos como podem a tecnologia para o bem comum, como partilhar o conhecimento ou apoiar-se mutuamente. Para além disso, ao incorporar a tecnologia na sala de aula, os professores podem focar-se numa utilização ética da tecnologia.

Dentro do uso responsável da tecnologia, existem regras que devem ensinar-se explicitamente, estabelecendo políticas firmes. As políticas servem como uma boa maneira de reduzir a agressão verbal ou digital e estabelecê-la como um comportamento inaceitável.

3. Solidariedade coletiva para reportar casos de abuso

Segundo um estudo da Safe2Tell, em 81% dos casos de violência escolar um grupo de alunos sabia acerca da agressão, mas por opção não reportaram a mesma. Na maioria destes casos, o silêncio deve-se principalmente ao medo de serem a próxima vítima ou ao castigo por parte dos adultos. Nestes casos, as crianças devem saber que a tecnologia não é o problema, mas sim o seu uso de forma irresponsável. Neste sentido, fomentar o diálogo e tempo para ouvir também contribui para que as crianças saibam a quem acudir nestes casos de violência.

Por outro lado, a violência on-line pode, e deve ser denunciada nas mesmas plataformas. Todas as redes sociais contam com uma opção para denunciar publicações, comentários e mesmo perfis responsáveis por abusos a uma determinada pessoa. Esta é a única forma de eliminar conteúdo agressivo nas redes sociais, já que ao acumular uma série de denúncias, a publicação ou o perfil são eliminados. Estas denúncias são completamente anónimas, pelo que não existe medo de represálias. Assim sendo, é importante ensinar aos mais pequenos como fazer uso desta opção e salientar junto deles que para além de falarem com um adulto numa situação de assédio, devem também denunciar na plataforma.

4. Diálogo: a base de todo o acompanhamento

Os estudantes necessitam saber a quem e onde podem acudir antes que ocorra algum problema. Neste sentido, a confiança é a chave para abrir o canal de diálogo. De acordo com estudos realizados, 25% das crianças e jovens acreditam que os adultos mais próximos deles sabem menos que eles sobre tecnologia. Esta diferença faz com que sintam que os seus problemas on-line são menosprezados e incompreendidos. O que acontece na Internet é muito sério para eles e não é encarado de ânimo leve. A sua identidade digital é essencialmente a mesma para eles que a sua pessoa física. Deste modo, se um estudante se aproxima com um problema, o professor deve entender que é um problema grave para a criança e tentar encontrar os recursos mais adequados para o solucionar.

É importante recordar que talvez os mais jovens saibam muito acerca do uso e funcionamento da tecnologia, mas os adultos têm definitivamente mais experiência de vida e maior perceção dos riscos que podem surgir. Neste sentido, explorar temas como os riscos tecnológicos, a segurança na Internet e o comportamento on-line podem ser a chave para fomentar o diálogo. Assim como também é necessário para romper o silêncio por trás do bullying e do ciberbullying, falando sobre casos que tenham acontecido e sua resolução. Neste sentido, os professores devem ser claros, empáticos e comunicar abertamente com os alunos.

Por último, entendendo a comunicação digital com parte do pequeno mundo de cada pessoa, podemos aplicar a seguinte reflexão de Eleanor Roosevelt: “Os direitos humanos começam em lugares pequenos, perto de casa, tão próximos e tão pequenos que não podem ser vistos em mapa nenhum. No entanto, eles são o mundo da pessoa individual, o bairro onde vive, a escola que frequenta, o lugar onde trabalha. Estes são os lugares onde todos os homens, mulheres e crianças procuram igualde de justiça, de oportunidades, de dignidade, sem discriminação. A menos que estes direitos tenham significado ali, terão pouco significado em qualquer outro lugar. Sem uma ação conjunta dos cidadãos para os defender perto de casa, procuraremos em vão o progresso no mundo maior”.

Por Cecilia Pastorino, ESET

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