Provavelmente já ouviu a expressão “pegada digital”, mas sabe o que significa realmente? Os seus conteúdos nas redes sociais, transações de pagamentos online, histórico de localizações, emails, textos enviados através das diferentes plataformas de mensagens instantâneas – estes são apenas alguns dos dados que fazem parte da sua pegada digital.
Dependendo da sua abordagem à privacidade na Internet, e dos seus hábitos de utilizações de redes sociais, estes dados podem ser recolhidos para criar um “retrato” bastante completo de si. E esses dados podem ser abusados por pessoas com intentos desonestos ou até ser vendidos na dark web.
Além disso, se tende a partilhar bastantes eventos pessoais nas redes sociais, essa também é informação que pode ser usada de forma maliciosa por stalkers, cyberbullies e outros cibercriminosos. E se ainda não acredita que isto possa constituir um problema, lembre-se sempre deste pedaço de sabedoria da Internet: “online, todas as pessoas são um alvo”.
A boa notícia é que existem três passos simples que os especialistas da empresa de cibersegurança ESET sugerem e que pode tomar para limpar a sua bagagem digital. E não tem de se tornar num eremita: tem sobretudo a ver com tomar decisões inteligentes e conseguir um equilíbrio entre privacidade e conveniência.
Passo n.º 1: verifique as definições e privacidade das suas redes sociais
O primeiro passo a tomar deverá consistir na configuração detalhada das definições de privacidade em todas as redes sociais onde está presente. Isto inclui verificar quem pode encontrar o seu perfil em cada uma dessas redes e, sobretudo, quem pode ver os seus conteúdos.
Dependendo do número de redes que utilize, este é um processo que poderá ser um pouco tedioso, mas vale bem o esforço.
O próximo passo pode ser ainda mais aborrecido mas, uma vez mais, valerá a pena: deverá passar em revista os seus posts, quer passados, quer mais recentes. Afinal, ninguém quer saber sobre o brunch que teve com os seus amigos naquela viagem de 2009 a França (sabe que 2009 já foi há mais de 10 anos, certo?!).
Se for daquelas pessoas que fazem posts diariamente (e até mais do que uma vez), esta pode ser uma tarefa para várias horas. Contudo, veja as coisas pelo lado positivo: poderá ser um exercício interessante para pensar melhor no tipo de coisas que quer que todos (ou apenas ou seus amigos mais chegados) vejam.
Além de contribuir para reduzir a sua pegada digital, poderá ajudar a prevenir que posts antigos surjam subitamente para lhe causar problemas no futuro.
Uma vez feita esta auditoria aos seus posts e alteradas as definições de privacidade do seu perfil para limitar quem tem acesso ao seu conteúdo, chegou a altura de limpar a sua lista de “amigos”. Poderá soar um pouco drástico, mas pense que isto consiste sobretudo em curar a lista de pessoas (muitas delas não são sequer suas amigas!) que têm acesso aos seus posts e ao seu perfil.
Comece por remover os estranhos de que nem sequer se lembra de ter adicionado; depois continue para a lista dos conhecidos… que não conhece muito bem, das pessoas com quem nunca fala, e por aí fora. Se está a pensar, “mas qual é o mal se estranhos virem os meus posts?”, lembre-se que os seus posts podem relevar muito sobre si.
Num dos exemplos mais recentes, cibercriminosos conseguiram criar uma imagem bastante definida dos hábitos de celebridades, monitorizando as suas contas de Instagram, de forma a poderem facilmente roubar as suas casas quando estavam ausentes.
Passo n.º 2: verifique outras contas que tenha e limpe-as
A maioria das pessoas possui dezenas, nalguns casos centenas, de contas online. Você provavelmente criou contas em inúmeros websites de comércio eletrónico que poderá ter usado apenas um ou duas vezes, em “fitness trackers”, aplicações, jogos, etc… A lista deverá ser longa. Cada uma destas contas certamente guarda diferentes tipos de informações sobre si, incluindo nome, data de nascimento e morada, mas também coisas bem pessoais, como peso, medidas corporais e número de telefone.
Para tornar o processo de inscrição mais fácil, muitas vezes usamos opções de inscrição tipo SSO (Single Sign On) que usam as nossas contas das redes sociais. Uma vez que não é fácil manter uma lista de todos os serviços, apps e lojas em que nos fomos inscrevendo ao longo dos anos, este é um método prático.
No momento de fazermos a nossa “limpeza de Primavera”, podemos também aproveitar estas opções de SSO que temos vindo a usar – sejam elas contas do Facebook, da Google, da Apple ou outras – para verificarmos a quem demos acesso e, se necessário, revogarmos esse acesso e apagar o vínculo entre as contas.
Caso tenha optado por usar determinados endereços de email para se inscrever nesses serviços, poderá sempre ir às caixas de email respetivas e procurar palavras chave como “unsubscribe”, “sign in” ou “welcome”, que normalmente possuem instruções para anular a inscrição.
Passo n.º 3: ponha ordem nas suas newsletters
E, já que falamos em verificar o conteúdo das suas caixas de correio, outra forma de diminuir a sua pegada digital passa por reduzir o número de newsletters que anda a receber.
Muitas destas subscrições de newsletters surgem em paralelo com a criação de contas para vários serviços e lojas online, que depois usam emails para bombardear com várias ofertas de descontos e promoções. E estes são dados adicionais que as empresas têm sobre si e que poderão cair nas mãos erradas.
Sejamos honestos: a maioria das pessoas não lê as “letras pequenas” quando cria uma conta e acaba por clicar sem pensar no que quer que seja necessário para acelerar o processo de inscrição. Por isso, acabamos todos por ficar com dezenas ou até centenas de emails que vão parar à pasta das subscrições, do correio não solicitado ou até mesmo da inbox principal.
Uma vez anulada a subscrição destas newsletters, deverá criar um endereço de email dedicado para usar só em compras não recorrentes. Isto trará dois benefícios: o primeiro é que o seu email principal será reservado apenas paras as coisas importantes; o outro é que terá este tipo de contas todas sob um só “telhado” com os seus dados ao abrigo de sequestro.
Em alternativa, quando estiver a inscrever-se para algo que só pretende usar uma vez, poderá também usar um endereço de email “descartável”. Faça uma pesquisa na web e irá encontrar várias recomendações.
Dicas adicionais
Minimizar a sua pegada digital não tem de terminar com o que lhe sugerimos nestas três dicas. Outro passo importante que poderá tomar é usar uma rede privada virtual, ou VPN. As VPN funcionam com “túneis” cifrados para o seu tráfego na Internet, mantendo os seus hábitos de navegação realmente privados e evitando que os seus passos sejam seguidos.
Como benefício adicional, as VPN são também usadas pelas empresas para permitir aos seus funcionários o trabalho à distância e o acesso seguro às suas redes.
Para quem, como nós, vive na União Europeia, existe também legislação adicional, como é o caso do “direito a ser esquecido”[1]. Isto permite, em determinadas condições, obrigar os motores de busca a remover determinada informação sobre si.
Pode também usar a ferramenta “Privacy Checkup” da Google[2] (e outras semelhantes, de outros serviços) para saber que dados sobre si estão guardados e removê-los também. Aliás, já que está com a mão na massa, pode também fazer o mesmo com a ferramenta de verificação de privacidade do Facebook[3].
Em resumo, apesar do esforço para minimizar a sua pegada digital poder parecer uma tarefa árdua, vale bem a pena o que irá obter em termos de melhoria da sua privacidade.
[1] https://edpb.europa.eu/our-work-tools/our-documents/guidelines/guidelines-52019-criteria-right-be-forgotten-search-engines_pt