A segurança informática deve ser um tema abordado na escola?

O uso da tecnologia expõe as pessoas a um grande número de ameaças digitais e a educação é a principal ferramenta para estar prevenido.

A educação formal é fundamental no processo de inserção das novas gerações na sociedade. Neste sentido, o sistema de educação de cada país procura proporcionar aos cidadãos não apenas conhecimentos académicos elementares, mas também ajudá-los a desenvolver competências para enfrentar a vida, tendo em conta os desafios de uma época. Considerando que contar com essas competências é importante para os membros de uma sociedade, a educação digital é fundamental, dado o papel que a tecnologia ocupa nos tempos atuais e futuros. Portanto, entendemos que poderia fazer parte da lista de competências essenciais para enfrentar os desafios da vida.

Por esta razão, como parte da série de artigos que estamos a publicar durante este mês de novembro, em comemoração do Antimalware Day 2019, decidimos perguntar a empresas de diferentes países, que têm também um papel ativo na educação sobre questões relacionadas com a segurança na Internet, se consideram que crianças e jovens concluem a educação formal com as habilidades necessárias para enfrentar os desafios que se colocam no que respeita à cibersegurança; se consideram que há falta de visão sobre a importância da educação em segurança informática para os cidadãos do mundo atual; se a educação formal obrigatória deve abordar algumas das diferentes questões que constituem a segurança e se acreditam que os professores das diferentes etapas da educação estão preparados para enfrentar tal tarefa.

As crianças e jovens que concluem as várias fases de ensino adquirem competências suficientes para enfrentar os desafios relacionados com a segurança informática?

De acordo com a descrição do projeto “Promoção da Segurança Informática no âmbito escolar”, da Universidade Nacional de Córdoba, na Argentina, os mais jovens que não estão conscientes dos riscos envolvidos na publicação excessiva de fotos, comentários e informações privadas nas redes sociais, não associam essas práticas a problemas que muitas vezes os afetam, como o grooming, o sexting, o cyberbullying e o phishing.

No entanto, como explicam os criadores deste projeto, que capacita estudantes do ensino médio para dar conferências sobre segurança informática nas escolas, o crescimento destas questões tem gerado a necessidade de que pais e instituições de ensino solicitem informações sobre estes temas, bem como sobre proteção de dados, identidade digital e roubo de informações, criptografia básica, uso incorreto de redes ou prevenção de ataques através da web.

Para conhecer outras opiniões, procurámos algumas instituições de diferentes países para que, de acordo com as suas realidades, pudessem destacar o que pensam sobre a educação em segurança em ambientes digitais.

A Argentina Cibersegura, associação civil que realiza atividades de conscientização e educação sobre segurança em ambientes digitais na Argentina, concorda que os alunos não são preparados sobre o tema e explica que isto pode ter vários motivos. “Por um lado, pelo simples fato da base nacional comum curricular não incluir esta temática, sendo da responsabilidade de cada instituição de educação decidir se deve ou não dar aulas sobre educação digital. Além disso, a formação docente não está direcionada para que os professores também possam aprender mais sobre segurança informática. O foco costuma ser dado apenas aos conteúdos que são considerados úteis para as futuras gerações, como programação ou robótica, deixando de lado a formação de pessoas que saibam ser, fazer e conviver no mundo digital”, explica a ONG.

Em países como a Inglaterra, foram feitas mudanças na base curricular que serão adotadas pelas escolas e entrarão em vigor a partir de setembro de 2020. Essas modificações contemplam a educação em segurança informática e até desenvolveram um guia orientado para as escolas para que possam ensinar a forma ideal para se protegerem no mundo digital. No entanto, especialistas consideram que apenas uma mudança curricular talvez não seja suficiente. Claire Levens, da Internet Matters, uma organização sem fins lucrativos sediada em Inglaterra, acredita que “embora as mudanças na base curricular estejam bem estabelecidas, além de serem adequadamente financiadas, devem ser acompanhadas pelo nível apropriado de formação de professores, e no caso de Inglaterra, a menos que algo mude para proporcionar investimentos e capacitações, é difícil ver como essas mudanças sozinhas podem chegar a ser suficientes”.

Falta de visão sobre a importância da educação em segurança informática

É comum que seja difícil ter noção da dimensão real de um problema até que ele nos afete diretamente ou afete a alguém próximo. As fontes entrevistadas concordam que existe uma falta de visão sobre a importância da educação nestas questões. “Os cidadãos podem estar focados em fazer uso da tecnologia, mas sem saber, por exemplo, que informações pessoais ou corporativas podem ser expostas e de que forma alguém se pode aproveitar delas. Isso faz com que não se preocupem sobre a segurança até que sejam vítimas de um ataque”, explica a UNAM-CERT. “Muitas vezes a segurança informática é vista como um custo e não como um investimento, o que significa que os recursos não são alocados para que os utilizadores possam preparar-se para essas questões, quando na realidade investir em educação poderia representar uma economia, evitando o impacto que pode causar um ataque informático”, acrescentam.

Para além do valor da educação e da sua incidência direta na prevenção de ataques e para que os cidadãos estejam preparados sobre o que fazer em situações de risco, considerando a escassez e a procura de profissionais formados nesta área, a educação também pode ajudar os mais jovens a descobrir no campo da segurança uma área de interesse.

No Brasil, desde 2010, o Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br) realiza entrevistas com alunos, professores, coordenadores pedagógicos e diretores para mapear o acesso, o uso e a apropriação das tecnologias de informação e comunicação (TIC) em escolas públicas e privadas de educação básica. Os indicadores desenvolvidos pelo estudo TIC Educação apontam relevantes características relativas a: escolas, alunos, professores, coordenadores pedagógicos e diretores. A pesquisa realizada pelo Cetic.br está alinhada ao referencial metodológico proposto nos relatórios InfoDev, do Banco Mundial, e no estudo Sites 2006 (Second Infomation Technology in Education Study), da International Association for the Evaluation of Educational Achievement (IEA).

A educação em segurança informática deve fazer parte do currículo escolar?

Como vimos anteriormente, assuntos como a segurança on-line, que estão dentro da “árvore” da segurança informática, foram incluídos na base curricular de Inglaterra para o próximo ano. Segundo a Argentina Cibersegura, em Espanha também já foi proposta a inclusão destes assuntos na base curricular de educação para as crianças. A Lei Orgânica de Proteção de Dados Pessoais e garantia dos direitos digitais, que entrou em vigor em Espanha, em dezembro de 2018, surge da necessidade de adaptar o ordenamento jurídico espanhol ao Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD) e inclui em um dos seus capítulos o tema dos direitos da era digital, fazendo referência à abordagem da educação digital desde a infância.

Desta forma, o artigo estabelece que o sistema educativo deve garantir a inserção dos alunos na sociedade digital para que naveguem de forma segura, garantindo a privacidade e a proteção dos dados pessoais, contemplando também as situações que podem surgir do uso inadequado das Tecnologias da informação e Comunicação (TIC), fundamentalmente situações de violência na rede, para além de proporcionar aos professores a formação necessária.

Tendo como referência o exemplo da Espanha, a ONG considera que a educação para a segurança deve ser incluída na base curricular obrigatória, uma vez que “o objetivo da escola ainda é formar cidadãos, e a dimensão digital não pode ser esquecida”, comentaram. Na mesma linha, a UNAM-CERT concorda que “as questões de prevenção em segurança informática dirigidas aos utilizadores finais devem ser abordadas de forma obrigatória no ensino fundamental e médio, considerando que vivemos num mundo virtual e interligado – sem a necessidade de ter que contar com conhecimentos especializados em tecnologias. O importante é que os estudantes possam entender como funcionam as tecnologias e quais os seus riscos. Desta forma, todos poderão saber quais as medidas de proteção que devem tomar”, explica.

Os professores estão preparados para esta tarefa?

Embora alguns professores utilizem as tecnologias colaborativas durante as suas aulas, na tentativa de aproveitar recursos para tornar os encontros mais atraentes para os alunos, isto não significa que eles estejam qualificados para abordar a questão da segurança na Internet, bem como outras questões relacionadas com a segurança informática.

Existem diversas iniciativas por todo o mundo que trabalham para a formação de professores que lidam com crianças no processo educativo, com o objetivo de proporcionar às gerações futuras as ferramentas necessárias para enfrentar os desafios da segurança da informação. Em países como os Estados Unidos, organizações como o United States Department of Homeland Security (DHS) contam com o Cybersecurity Education Training Assistance Program (CETAP). Em Massachusetts, por exemplo, em 2016, a Clark University desenvolveu um programa para a rede pública de ensino de Shrewsbury, no mesmo estado, com o objetivo de educar os mais jovens como cidadãos tecnológicos, e orientá-los sobre os riscos relacionados com a tecnologia. Embora ainda tenhamos um grande caminho que deve ser percorrido, a importância da educação em segurança informática está a tornar-se algo mais evidente.

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